Pesquisar neste blog

Postagens populares

quinta-feira, 31 de maio de 2012

Calos; sempre calo.






Sonhei com você essa noite. 
Sonhei que a gente dava certo. 
Sonhei que a gente tinha sido feito um pro outro. 
Sonhei que você me deu bom dia quando acordou. 
Sonhei que você me fez um carinho e se interessou pelo meu dia. 
Sonhei que nossa noite tinha sido quente e saído da rotina. 
Sonhei que conseguia ignorar que todos os calos na superfície da minha alma não eram resultado das suas repetidas grosserias.
Sonhei que queria acordar. 
Sonhei que você não era meu pesadelo. 
Sonhei que teria coragem para dar um basta. 
Sonhei que não te queria mais.

Acordei. Você do meu lado. Coloquei a mão no seu rosto. Ameacei começar a falar. Hesitei. Suspirei. Não consigo. Sonhei.

terça-feira, 29 de maio de 2012

Cigarro, tempo, bateria.







Ela tinha aquela mania de coçar a nuca enquanto bocejava. Seus olhos lacrimejavam e denunciavam o cansaço que acabava de chegar. Acendeu um cigarro. Marlboro Light. Ela sempre fumava esse. Ali, sentada na cama, vestindo um short laranja que usava para dormir e um top branco com um furo na alça, coçava os olhos fazendo borrar o lápis preto de doze horas atrás. Observava o quanto havia engordado e se esforçava para esconder, apesar de não ter ninguém olhando. Seus pensamentos eram cheios de espaços vazios que ela não conseguia preencher. Talvez não quisesse. Ou não era a hora. O tic-tac do relógio vermelho de parede que sua tia trouxe de Amsterdã só a fazia lembrar que poderia não ser a hora, mas que o ponteiro não parava. Nunca. O barulho era até irritante. Deu o último trago no cigarro, tirou outro do maço, o acendeu e o repousou no cinzeiro. Era um teste. Quantos minutos o cigarro demoraria para queimar até se transformar em cinzas? Olhou para o relógio, mentalizou uma contagem regressiva começando do três e já. Uma angústia penetrou sua alma e ao invés de apagar o cigarro, ela se colocou na ponta dos pés, agarrou o relógio e lhe arrancou a bateria. Quando olhou para o cinzeiro, o cigarro já havia queimado por completo. Sua solução foi paliativa. Tentar parar as horas, os minutos, os segundos; arrancar a bateria dos outros ou até mesmo a sua. Se não apagar o cigarro, ele continuará queimando. O tempo passa. A bateria acaba. O cigarro queima. Ela decidiu. Deixa estar, deixa passar, deixa queimar. Sempre tem outra bateria, outro cigarro, outro tempo. Suspirou e adormeceu.

Sobre o tempo






- Anda, vamos, pegue seu relógio! Tenho pressa e preciso ir embora! - você disse com o olhar desesperado e a voz arranhada, sem pausas.
- Eu não quero ir.
- Anda, vamos, pegue seu relógio. Você não quer tempo? O relógio tem, eu não.
Enquanto descíamos onze andares, os nossos passos iam se intercalando, ecoando nas paredes acinzentadas e geladas daquela escada.
- Para.
- Anda, vamos.
- Eu não quero seu tempo.
O ar congelou por dois segundos e voltou logo em seguida, como quando volta aos pulmões de alguém que parou de respirar por um momento.
- O quê?! - você disse ao parar e, quase indignado, franzindo a testa.
- Eu não quero e nem preciso do seu tempo. Ele é seu. Eu quero que você o compartilhe comigo. É tão difícil assim?
- É! - você gritou baixinho, antes mesmo que eu terminasse minha pergunta.
Silêncio. Eu não esperava uma resposta tão rápida.
Sabe quando você toma coragem para falar o que pensa e depois que fala, se ouve, e vê o tanto que aquilo soou estúpido e ridículo?
- É assim tão difícil porque com o tempo vem um laço; com um laço, vem um compromisso; com o compromisso, vem a escolha; com a escolha, vem a idade; com a idade, vem a rotina; com a rotina, vem o cansaço e com o cansaço, nós morremos. E o luto dói.
Não soube responder. Me calei e apertei meus olhos que começavam a chover.
- E depois de trinta e quatro anos, eu ainda não aprendi que o luto é só questão de tempo.
- Você é tão desiludido. - eu disse tentando engolir a mágoa.
- E você é tão iludida.
- Se minha percepção é distorcida, que seja! - eu reagi. Eu vejo você e meu coração responde. É como se quisesse conversar com o seu. E você aí, letárgico.
Nenhum de nós aumentou o tom de voz. Nem sequer uma vez. Conversávamos fitando os olhos intensamente, e como numa música com letra sombria e melodia contente, continuávamos ignorando a distância de um passo que já estávamos um do outro. O único barulho que eu conseguia ouvir agora era o da sua respiração.
- Não me deixa ir embora. Eu quero ficar.
- Não.
- Me pede para ficar.
- Não posso.
- Me beija. Se comprometa. Amarre seus laços na nossa rotina. Morra de cansaço comigo.
Nessa hora, coloquei o relógio em suas mãos e você o deixou cair. Você assistira o tempo se quebrar em câmera lenta. Como num piscar de olhos, você se abaixou e catando os pedaços, sussurrou:
- Anda, vamos, pegue seu relógio. Tenho pressa e preciso de você.

segunda-feira, 28 de maio de 2012

O início de tudo. Do nada.





Sua voz me contraria, sabia? 

Não me entenda mal! 
Não é que eu não goste dela. 
Pelo contrário! 
É que eu sei que enquanto te ouço, não estou tocando seus lábios nos meus, sentindo sua língua brincar com a minha, o gosto da sua vontade, sabe? 
É grave e me corrói cada momento que eu não posso arrancar um olhar do seu pensamento. Somos clandestinos. 
Foragidos. 
Somos o que não deveríamos ser. 
É como brincar de ser invisível. 
Estamos no olho do furacão e não temos uma ideia sequer de como faremos para sair daqui. Minto. 
Ideias temos aos montes. 
Rimos delas! 
Elas são meras ideias, palavras que não saem do plano, do papel, de mim, de você. Utopia. 
Penso mesmo que existam dois mundos. 
Você invadiu um espaço que não era seu e eu gostei. 
Eu deixei. 
E te prendi lá. 
Você é minha prisão e meu prisioneiro. 
Você é minha ilusão e minha besteira. 
Minha confusão e meu inteiro. 
Não! Só meio.

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Me atende.







Nesses momentos de análise interior, resolvi que iria tentar parar de gastar minhas energias com situações e problemas que eu não tinha o poder de resolver. Só que a linha entre o ficar parada e deixar o tempo passar e o de virar uma pessoa extremamente acomodada é delicada e tênue. Como saber se o problema não é meu? Como deixar pra lá se não tenho certeza de que nada posso fazer? Dizem que o amor é cego, e no caso de um relacionamento no qual todos os esforços são feitos apenas por um lado, sou obrigada a concordar. Cego porque não se ama sozinho, cego porque não se enxerga que está fazendo papel de idiota, cego porque você acha que pode abraçar o mundo sozinha, cego porque não vê que a rejeição já aconteceu, e você não quer aceitar. Você diz pra você mesma que você está fazendo o seu melhor e quer lutar pelo outro. Bonito isso. Na teoria. Porque na prática, você está lutando contra a parede. É triste e só você não vê. A outra pessoa, de longe, só fica te observando machucar e meter seu punho contra o concreto. Sim, o concreto é o que já acabou. Você dá seu sangue, e de nada adianta, só faz doer. 
Olha, uma pessoa que está no mínimo interessado não te passa só 6 números do telefone dela. Tenho que adivinhar os outros dois? Onde já se viu isso? Se você me passar seu número inteiro, não quero que esteja ocupado o tempo todo. Se você me ama, que seja por completo, me dê os oito números. E, acredite em mim, eu vou te ligar. Você me atende?

quinta-feira, 10 de maio de 2012

Minha perdição







O melhor da vida é perder. 
Perder a vergonha de errar, o medo de tentar.
É incrivelmente doloroso perder para dar valor.
Mas somos burros de alma. 
Teimosos de coração.
E não há ninguém para se culpar.

Eu quero perder.
Se perder significa aprender, eu quero.
Eu quero esgotar minhas energias
tentando fazer você entender
o quanto te desejo.
Quero contar as gotas de suor no seu corpo e
perder a noção do tempo.
Quero perder toda minha inocência
e continuar madura suficiente pra você
Quero entender quando você perder
e não quiser ceder.
Quero perder meus sapatos
correndo atrás dos nossos sonhos
Quero perder a distância entre nossos olhos.


O melhor da vida é perder.
Perder a mania de mentir, a maldade no falar.
É inevitável perder o intenso para a dor
Mas quero eu perder o corpo para ganhar a alma.
E, se é assim, serei teimosa: 
quero perder o coração para rimar com amor.







terça-feira, 8 de maio de 2012

Alarme: falso.








Aí a noite já começa com aquele turbilhão de pensamentos na cabeça, sentimentos embaralhados, uma bebida quente no criado para esquentar o debaixo da pele onde se escondem meus segredos. 
A vida é esse negócio de viver em treinamento para situações de emergência. 
Toca um alarme e eu nem ligo. 
Nunca acho que tem algo acontecendo. 
Eu sempre penso que é alarme falso. 
E olha, na maioria das vezes é. 
Aquele eu te amo mal dito. 
Tudo mentira.
Aquela traição maldita. 
Tudo falso.
Aquele relacionamento rasgado e impossível de remendar.
Besteira. 
O brabo é que dessa vez o alarme tocou e eu não fiz nada. 
Dessa vez me invadiram e eu nem vi. 
O caos se formou e eu nem percebi. 
Agora que o alarme já me ensurdeceu e finalmente fui capaz de tomar consciência que quem estava desmoronando era eu, peguei minha coragem, enfiei na mochila, vesti um casaco antigo ali com um pouquinho de lucidez nos bolsos e saí para enfrentar tudo para o que, até então, só tinha feito o treinamento. 
Que ironia dizer, mas até que sinto falta dos alarmes falsos.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Com prazo à vista










Não, não foi amor à primeira vista.
Nem à segunda.
Nem à terceira.
Talvez a prazo.
Prazo para o prazer e prazer a prazo.
Você entrou na minha vida e eu nem notei.
Calma! Não se sinta ofendido.
Eu não notei de primeira.
Nem de segunda.
Nem de terceira.
Demorou um tempo para eu admitir que você não só já tinha entrado
como já fazia parte do meu bom dia, da minha boa tarde, da nossa boa noite - e quão boa!
Acho que foram nos detalhes que você me amarrou.
Aqueles tão pequenos que eu mesma nem sabia que existiam.
Aquelas conversas intermináveis e o contrariar da vontade ao me despedir mesmo depois de ter passado o dia todo fazendo nada e tudo com você.
Como você consegue me conquistar assim todo dia?
Será a sua voz que arranca uma calma sem precedentes de dentro de mim?
Será seu olhar que me faz querer abandonar tudo e colar em você?
Será seu abraço que envolve meu mundo e amansa minha loucura?
Não foi a primeira, nem foi a segunda, nem a terceira.
Não me lembro mais quantas vezes foram que, com os olhos marejados, implorei para você ficar.
Agora, com prazo à vista,
seria diferente se eu te pedisse para não ir?