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quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Bate em disritmia





A verdade chega na hora que o sol começa a te cegar e você vira a cabeça bruscamente tentando desviar, aperta os olhos, fazendo as linhas sulcarem sua testa e o cantinho dos olhos; com um braço tenta achar um apoio para não cair prostrado no chão, com o outro tenta o fazer de escudo. Acordei. Cadê o sol? Onde estou? O coração bate em disritmia  São 3:42. Tudo escuro. Ouço uma respiração. Ainda atordoado, não sei do que se trata. Vou cheirando sua alma e encontro você ali do meu lado, respirando forte fazendo um barulhinho engraçado. Mexo meus lábios só para o lado direito e meus olhos relaxam, como as asas de um pássaro quando repousam ao cessar voo. Pisco lentamente. Me aproximo de você, coloco meu braço em volta da sua costela e vou descendo para a cintura; me encaixo, me esquento, respiro na sua nuca e desejo não sonhar mais. Torço para que o sol não chegue. Se a verdade só chega com o sol, prefiro viver na mentira da escuridão, acordado, ouvindo você dormir.


sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Paradoxo da luz





O duro é lidar com algo que você nunca viveu. O brabo é ser crucificado por uma atitude dita inconveninente, irresponsável e inconsiderada. O ignorante julga antes, se excede durante e não pensa no depois; tentar se colocar ali, de frente pro holofote, não faz parte da sua rotina. Ele não percebe o tanto que aquela luz pode deixar alguém cego, desorientado e cansado. Enxergar tudo de longe e se gabar por ter visto o que estava acontecendo é até um pouco simplório. Tudo que você quer é sair dali, mas quando não se enxerga uma saída, fica difícil discernir entre o certo e o errado. Aquela frase de procurar uma luz no fim do túnel não se encaixa aqui. Você quer sair da luz, mas não quer entrar na escuridão. Então o que escolher? É fácil? Você é meu convidado. Tente. Depois me diga se a vida não é um tanto quanto contraditória. Depois me diga, meu caro, se a sua batalha entre ter que escolher entre a luz que te cega e a escuridão que te deprime foi tranquila. 
É aí que se sonha com o paraíso de um quarto à meia luz. E desse, eu o convido a se retirar. 

quinta-feira, 31 de maio de 2012

Calos; sempre calo.






Sonhei com você essa noite. 
Sonhei que a gente dava certo. 
Sonhei que a gente tinha sido feito um pro outro. 
Sonhei que você me deu bom dia quando acordou. 
Sonhei que você me fez um carinho e se interessou pelo meu dia. 
Sonhei que nossa noite tinha sido quente e saído da rotina. 
Sonhei que conseguia ignorar que todos os calos na superfície da minha alma não eram resultado das suas repetidas grosserias.
Sonhei que queria acordar. 
Sonhei que você não era meu pesadelo. 
Sonhei que teria coragem para dar um basta. 
Sonhei que não te queria mais.

Acordei. Você do meu lado. Coloquei a mão no seu rosto. Ameacei começar a falar. Hesitei. Suspirei. Não consigo. Sonhei.

terça-feira, 29 de maio de 2012

Cigarro, tempo, bateria.







Ela tinha aquela mania de coçar a nuca enquanto bocejava. Seus olhos lacrimejavam e denunciavam o cansaço que acabava de chegar. Acendeu um cigarro. Marlboro Light. Ela sempre fumava esse. Ali, sentada na cama, vestindo um short laranja que usava para dormir e um top branco com um furo na alça, coçava os olhos fazendo borrar o lápis preto de doze horas atrás. Observava o quanto havia engordado e se esforçava para esconder, apesar de não ter ninguém olhando. Seus pensamentos eram cheios de espaços vazios que ela não conseguia preencher. Talvez não quisesse. Ou não era a hora. O tic-tac do relógio vermelho de parede que sua tia trouxe de Amsterdã só a fazia lembrar que poderia não ser a hora, mas que o ponteiro não parava. Nunca. O barulho era até irritante. Deu o último trago no cigarro, tirou outro do maço, o acendeu e o repousou no cinzeiro. Era um teste. Quantos minutos o cigarro demoraria para queimar até se transformar em cinzas? Olhou para o relógio, mentalizou uma contagem regressiva começando do três e já. Uma angústia penetrou sua alma e ao invés de apagar o cigarro, ela se colocou na ponta dos pés, agarrou o relógio e lhe arrancou a bateria. Quando olhou para o cinzeiro, o cigarro já havia queimado por completo. Sua solução foi paliativa. Tentar parar as horas, os minutos, os segundos; arrancar a bateria dos outros ou até mesmo a sua. Se não apagar o cigarro, ele continuará queimando. O tempo passa. A bateria acaba. O cigarro queima. Ela decidiu. Deixa estar, deixa passar, deixa queimar. Sempre tem outra bateria, outro cigarro, outro tempo. Suspirou e adormeceu.

Sobre o tempo






- Anda, vamos, pegue seu relógio! Tenho pressa e preciso ir embora! - você disse com o olhar desesperado e a voz arranhada, sem pausas.
- Eu não quero ir.
- Anda, vamos, pegue seu relógio. Você não quer tempo? O relógio tem, eu não.
Enquanto descíamos onze andares, os nossos passos iam se intercalando, ecoando nas paredes acinzentadas e geladas daquela escada.
- Para.
- Anda, vamos.
- Eu não quero seu tempo.
O ar congelou por dois segundos e voltou logo em seguida, como quando volta aos pulmões de alguém que parou de respirar por um momento.
- O quê?! - você disse ao parar e, quase indignado, franzindo a testa.
- Eu não quero e nem preciso do seu tempo. Ele é seu. Eu quero que você o compartilhe comigo. É tão difícil assim?
- É! - você gritou baixinho, antes mesmo que eu terminasse minha pergunta.
Silêncio. Eu não esperava uma resposta tão rápida.
Sabe quando você toma coragem para falar o que pensa e depois que fala, se ouve, e vê o tanto que aquilo soou estúpido e ridículo?
- É assim tão difícil porque com o tempo vem um laço; com um laço, vem um compromisso; com o compromisso, vem a escolha; com a escolha, vem a idade; com a idade, vem a rotina; com a rotina, vem o cansaço e com o cansaço, nós morremos. E o luto dói.
Não soube responder. Me calei e apertei meus olhos que começavam a chover.
- E depois de trinta e quatro anos, eu ainda não aprendi que o luto é só questão de tempo.
- Você é tão desiludido. - eu disse tentando engolir a mágoa.
- E você é tão iludida.
- Se minha percepção é distorcida, que seja! - eu reagi. Eu vejo você e meu coração responde. É como se quisesse conversar com o seu. E você aí, letárgico.
Nenhum de nós aumentou o tom de voz. Nem sequer uma vez. Conversávamos fitando os olhos intensamente, e como numa música com letra sombria e melodia contente, continuávamos ignorando a distância de um passo que já estávamos um do outro. O único barulho que eu conseguia ouvir agora era o da sua respiração.
- Não me deixa ir embora. Eu quero ficar.
- Não.
- Me pede para ficar.
- Não posso.
- Me beija. Se comprometa. Amarre seus laços na nossa rotina. Morra de cansaço comigo.
Nessa hora, coloquei o relógio em suas mãos e você o deixou cair. Você assistira o tempo se quebrar em câmera lenta. Como num piscar de olhos, você se abaixou e catando os pedaços, sussurrou:
- Anda, vamos, pegue seu relógio. Tenho pressa e preciso de você.

segunda-feira, 28 de maio de 2012

O início de tudo. Do nada.





Sua voz me contraria, sabia? 

Não me entenda mal! 
Não é que eu não goste dela. 
Pelo contrário! 
É que eu sei que enquanto te ouço, não estou tocando seus lábios nos meus, sentindo sua língua brincar com a minha, o gosto da sua vontade, sabe? 
É grave e me corrói cada momento que eu não posso arrancar um olhar do seu pensamento. Somos clandestinos. 
Foragidos. 
Somos o que não deveríamos ser. 
É como brincar de ser invisível. 
Estamos no olho do furacão e não temos uma ideia sequer de como faremos para sair daqui. Minto. 
Ideias temos aos montes. 
Rimos delas! 
Elas são meras ideias, palavras que não saem do plano, do papel, de mim, de você. Utopia. 
Penso mesmo que existam dois mundos. 
Você invadiu um espaço que não era seu e eu gostei. 
Eu deixei. 
E te prendi lá. 
Você é minha prisão e meu prisioneiro. 
Você é minha ilusão e minha besteira. 
Minha confusão e meu inteiro. 
Não! Só meio.

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Me atende.







Nesses momentos de análise interior, resolvi que iria tentar parar de gastar minhas energias com situações e problemas que eu não tinha o poder de resolver. Só que a linha entre o ficar parada e deixar o tempo passar e o de virar uma pessoa extremamente acomodada é delicada e tênue. Como saber se o problema não é meu? Como deixar pra lá se não tenho certeza de que nada posso fazer? Dizem que o amor é cego, e no caso de um relacionamento no qual todos os esforços são feitos apenas por um lado, sou obrigada a concordar. Cego porque não se ama sozinho, cego porque não se enxerga que está fazendo papel de idiota, cego porque você acha que pode abraçar o mundo sozinha, cego porque não vê que a rejeição já aconteceu, e você não quer aceitar. Você diz pra você mesma que você está fazendo o seu melhor e quer lutar pelo outro. Bonito isso. Na teoria. Porque na prática, você está lutando contra a parede. É triste e só você não vê. A outra pessoa, de longe, só fica te observando machucar e meter seu punho contra o concreto. Sim, o concreto é o que já acabou. Você dá seu sangue, e de nada adianta, só faz doer. 
Olha, uma pessoa que está no mínimo interessado não te passa só 6 números do telefone dela. Tenho que adivinhar os outros dois? Onde já se viu isso? Se você me passar seu número inteiro, não quero que esteja ocupado o tempo todo. Se você me ama, que seja por completo, me dê os oito números. E, acredite em mim, eu vou te ligar. Você me atende?

quinta-feira, 10 de maio de 2012

Minha perdição







O melhor da vida é perder. 
Perder a vergonha de errar, o medo de tentar.
É incrivelmente doloroso perder para dar valor.
Mas somos burros de alma. 
Teimosos de coração.
E não há ninguém para se culpar.

Eu quero perder.
Se perder significa aprender, eu quero.
Eu quero esgotar minhas energias
tentando fazer você entender
o quanto te desejo.
Quero contar as gotas de suor no seu corpo e
perder a noção do tempo.
Quero perder toda minha inocência
e continuar madura suficiente pra você
Quero entender quando você perder
e não quiser ceder.
Quero perder meus sapatos
correndo atrás dos nossos sonhos
Quero perder a distância entre nossos olhos.


O melhor da vida é perder.
Perder a mania de mentir, a maldade no falar.
É inevitável perder o intenso para a dor
Mas quero eu perder o corpo para ganhar a alma.
E, se é assim, serei teimosa: 
quero perder o coração para rimar com amor.







terça-feira, 8 de maio de 2012

Alarme: falso.








Aí a noite já começa com aquele turbilhão de pensamentos na cabeça, sentimentos embaralhados, uma bebida quente no criado para esquentar o debaixo da pele onde se escondem meus segredos. 
A vida é esse negócio de viver em treinamento para situações de emergência. 
Toca um alarme e eu nem ligo. 
Nunca acho que tem algo acontecendo. 
Eu sempre penso que é alarme falso. 
E olha, na maioria das vezes é. 
Aquele eu te amo mal dito. 
Tudo mentira.
Aquela traição maldita. 
Tudo falso.
Aquele relacionamento rasgado e impossível de remendar.
Besteira. 
O brabo é que dessa vez o alarme tocou e eu não fiz nada. 
Dessa vez me invadiram e eu nem vi. 
O caos se formou e eu nem percebi. 
Agora que o alarme já me ensurdeceu e finalmente fui capaz de tomar consciência que quem estava desmoronando era eu, peguei minha coragem, enfiei na mochila, vesti um casaco antigo ali com um pouquinho de lucidez nos bolsos e saí para enfrentar tudo para o que, até então, só tinha feito o treinamento. 
Que ironia dizer, mas até que sinto falta dos alarmes falsos.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Com prazo à vista










Não, não foi amor à primeira vista.
Nem à segunda.
Nem à terceira.
Talvez a prazo.
Prazo para o prazer e prazer a prazo.
Você entrou na minha vida e eu nem notei.
Calma! Não se sinta ofendido.
Eu não notei de primeira.
Nem de segunda.
Nem de terceira.
Demorou um tempo para eu admitir que você não só já tinha entrado
como já fazia parte do meu bom dia, da minha boa tarde, da nossa boa noite - e quão boa!
Acho que foram nos detalhes que você me amarrou.
Aqueles tão pequenos que eu mesma nem sabia que existiam.
Aquelas conversas intermináveis e o contrariar da vontade ao me despedir mesmo depois de ter passado o dia todo fazendo nada e tudo com você.
Como você consegue me conquistar assim todo dia?
Será a sua voz que arranca uma calma sem precedentes de dentro de mim?
Será seu olhar que me faz querer abandonar tudo e colar em você?
Será seu abraço que envolve meu mundo e amansa minha loucura?
Não foi a primeira, nem foi a segunda, nem a terceira.
Não me lembro mais quantas vezes foram que, com os olhos marejados, implorei para você ficar.
Agora, com prazo à vista,
seria diferente se eu te pedisse para não ir?

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Luto







Luto por um luto.
Um minuto de silêncio. 
É tudo que eu peço. 
Um minuto de silêncio interior. 
Para tudo só por um minuto, por favor. 
Para o aqui permanecer aqui e o depois existir. 
Para uma solidão de momento não parecer ser só solidão. 
Para uma coexistência saudável entre mim e meu eu. 
Para tudo! Eu quero respirar. Não aguento mais essa falta de ar. 
Eu tenho pressa de pensamentos e raciocínio pesado, mas não quero mais pensar. 
Por um minuto. 
Só peço mais um minuto para eu me vestir de preto e lamentar a morte do que me causa dor e ressurgir no amor. 

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Sou eu. Abre.







Fui lentamente chegando minha camiseta branca no lugar, ouvindo o barulho do meu zíper subindo, fechando com ele meu pudor, as palavras sujas, o gosto molhado da noite não esperada e sim, ensandecida. Meu olhar ficou parado, fixo naquela parede que tinha o cheiro do seu suor misturado com o meu. Fui me enlouquecendo com flashes da sua pele sugando minha libido, com cada pulsação, cada lugar do meu corpo latejando causando arrepios, me fazendo conversar na língua do tesão. 




A campainha tocou e eu estava com meu moletom cinza e aquelas olheiras típicas de uma noite após um cansativo dia de esforço mental. Fui andando em direção à porta, com meu livro na mão, o dedo indicador entre as páginas funcionando como marcador e me perguntando quem poderia ser. O vizinho, talvez. Mas a essas horas? 
- Quem é?
Silêncio. Pergunto novamente e ouço alguém dizer calmamente do outro lado:
- Sou eu. Abre.
Meu coração disparou na hora. Senti como se ele não pertencesse mais a mim. Um peixe vivo fora d'água que você tenta segurar em suas mãos. Em vão. Minhas mãos começaram a suar. Respirei fundo, repousei meu corpo sobre a porta e lentamente girei a maçaneta. Ao ouvir o clique do desencaixe, senti você fazer uma leve pressão empurrando a porta contra mim. Um passo e você já estava dentro segurando meus braços, me forçando a andar para trás, como numa dança. Passo a passo. Nos entreolhando. Fixamente.
Sofá. Nenhuma palavra. Parede. Sons. Tapas. Intensidade. Provocação. Insanidade. Fugacidade. Oi. Um sorriso. Te amo. Adeus.

terça-feira, 10 de abril de 2012

Lado B







Eu estou cansada, mas não desisti. Estou queimando por dentro, mas estou pronta pra te acalmar, aferrecer. Eu rodopio, canto um canto e dou um pio, perdida. Me achei. Seguro minhas mãos frágeis, trêmulas e me desdobro e desviro para achar a coragem e a braveza que você exige de mim. Auto-salvamento. Procuro formas pra me encaixar em sua forma. Não encaixo. Não vou encaixar. Você gosta de mim assim, desencaixada. Fazer o quê? É essa nossa extravagante capacidade de arder de amor e irradiar entre olhares amargos, arredios e salinos. Vivemos entre contos e canções, entre o cliché e o lado B, atravessados na garganta, invertidos no coração, inimagináveis na mente alheia e perfeitamente possíveis do lado cá. No meu mundo você faz todo o sentido do mundo, mesmo que imundo.

quinta-feira, 29 de março de 2012

Puzzle it in a lie







A vida é um quebra-cabeça que, para montar, demanda esforço físico e mental.
Mentir é como pegar uma de suas peças e esconder; o quebra-cabeça nunca fica completo sem essas peças que você mesmo escondeu. A peça de uma verdade nunca vai repor a peça de uma mentira, e assim, isso tudo se transforma em um jogo no qual você pode escolher viver incompleto, porém impune ou completo e sujo. A verdade é que não existe um quebra-cabeça completo. Todo mundo tem suas indignas - e, talvez necessárias - peças da mentira.

sexta-feira, 23 de março de 2012

Duas sinceridades







Saudade daquela segunda-feira gelada. Finalmente criei coragem para me aproximar de você. Fui chegando mais perto sob o pretexto de estar com princípio de hipotermia. Tá, exagero meu. Só estou com frio. Aquela velha tática, eu reclamo do frio e você tem duas opções: me empresta sua blusa ou me abraça. Prefiro a última.
- Quer minha blusa?
- Não, claro que não! Se você me emprestar a sua, você quem vai sentir frio. Aí não vale.
- Não me importo.
Enquanto ele entrelaçava os braços em frente ao peito e agarrava os dedos na borda da blusa para tirá-la, eu num impulso - vindo, juro, não sei da onde - coloquei minha mão em cima de seu blusão e o impedi. Seus olhos se abriram rapidamente e me olharam, arregalados. Logo correram para o sul e avistaram ali a minha mão, intrépida, aventureira, corajosa e firme. Bom, essa era a expectativa. Agora a realidade, vamos lá. Eu parecia um defunto. Nem eu mesma acreditava que tinha feito aquilo. Ainda bem que era, de fato, um dia gelado, e eu tinha uma desculpa para minhas mãos trêmulas e congelantes.
- Você não quer?
- É... Bem, não. Não exatamente, sabe?
Nessa hora eu pensei em tirar minha mão de cima do braço dele, mas ele também não tinha tomado a iniciativa de mover o braço dali, ele simplesmente afrouxou e os repousou sobre o abdomen. Que culpa tenho eu? 
- Como assim?
- Deixa pra lá. É que...
Ele foi escorregando minha mão sobre seu braço até chegar em sua mão. 
- Nossa! Que mão fria!
Colocou-a entre as suas como uma carne no meio de dois pães. Com aqueles típicos movimentos de vai-e-vem, ele foi tentando um aquecimento provocado pelo atrito. Mal sabe ele em qual calor eu penso promover através de movimentos bem parecidos, eu diria. Enfim.
- Obrigada, viu?
- Você ainda não me disse o que quer.
- Já que você esquentou minha mão, acho que merece uma sinceridade.
- Posso esquentar a outra. Aí você me deve "duas sinceridades", ó!
Eu pareço estar sofrendo um derrame quando estou numa situação dessas. Porque, olha, só pode ser isso. Eu fico apática. Mas, contraditoriamente, meu sangue deve parar de circular no meu cérebro e ir todo para o coração. Juro. Eu não sou normal. Cento e setenta batimentos por minuto, mãos produzindo gotículas de suor a todo vapor, pupilas dilatando feito um buraco negro... 
- Você.

Isso é o fim!




Andei pensando e me perguntando por que o final sempre nos fascina mais. Já percebeu? A gente sempre quer saber o final de um livro, o final de uma história, o final de uma novela. O fim da vida. Pra onde iremos? Realmente acaba? Ou é o começo de outro fim? O fim também pode ser traduzido como resultado. O resultado é o que mais importa. Onde vai dar o seu relacionamento, quantos filhos você vai ter, quanto você vai receber no fim do mês.
É sofrido pensar só no fim das coisas. Tudo acaba, eventualmente. Então eu proponho uma mudança de parâmetros, de mentalidade, de atitude. Não vou me preocupar com o final. Vou me preocupar no caminho que vou trilhar até chegar no inevitável fim. Vou tratar de dar um brilho na minha história, cuidar mais de quem gosta de mim, trabalhar mais, reclamar menos, sorrir mesmo quando o meio de campo estiver embolado, chorar quando necessário, planejar sem medo de dar errado. Muita coisa eu nem pedi pra começar, não sei quando irá terminar, mas tenho certeza que posso mudar como.

sexta-feira, 16 de março de 2012

Expirada pela insônia







Ah, essas noites inspiradas e expiradas pela insônia, insistentes em deixar meu corpo sem repousar e sem sentir aquela única hora que a falta do oxigênio é interessantemente deliciosa, conseguindo provocar bocejos que lacrimejam meus olhos e me fazem balbuciar palavras desarticuladas. Maldita insônia. O meu olho esbugalhado só me faz lembrar que não irei dormir pelas próximas horas. Todos se despedem com desejos verdadeiros - ou não - de boa noite e eu começo a suspirar pelos cantos, pensando comigo mesma se irei - ou que horas, de fato - ter uma boa noite de sono. A ansiedade não ajuda em nada. Fico estressada porque estou ansiosa porque não consigo dormir. Fez sentido? Não? Ah, foda-se. Desculpa, estou um pouco nervosa. É que não quero ficar aqui sozinha enquanto todos dormem. Fica comigo? Quem sabe meu sono goste de você aqui comigo e resolva me consumir. Bom, eu já gosto. Vem?

segunda-feira, 12 de março de 2012

A insustentável leveza do caos







Viver em constante caos cansa. Caos da mente. Caos do corpo. Caos da cidade. Puro caos. 
O caos causa dormência, desordem, confusão, irritação, impaciência. Causa dor, irreverência, imprudência.
Mas o pior caos é aquele proveniente dos pensamentos. Desorganizados, eles se perdem nos impulsos nervosos e nas sinapses, provocando atos involuntários, irrefletidos nas ligações improváveis que minha mente insiste em fazer. Nessas idas e vindas caóticas, eu me ausento de mim e me projeto na culpa. Engano meu, isso, de tentar ir contra uma teoria tão consistente porém impraticável. E é em detrimento do meu próprio ser que eu gosto de praticar o impraticável, enganar a ilusão. Me faço impune dentro do impossível. Eu anseio pelo inatingível. Naqueles vazios que causam uma sensação de arrepiar os ossos, eu me ouço, me compreendo, mas fico arredia de mim mesma. Mas assim, invento novas formas de me reinventar e novos estilos de reaprender a viver intensamente nessa insustentável leveza do caos.

terça-feira, 6 de março de 2012

Fora do lugar







Meu quarto está uma bagunça. Está tudo fora do lugar. Interessante isso. Eu decido qual o lugar que algo deve ficar, mas quando eu mesma o tiro de lá, o considero, oficialmente, fora do lugar. Irônico, não? 
Mais irônico é que, por mais que esteja bagunçado, eu conheço minha bagunça, sei exatamente como revirar uma gaveta para achar uma coisinha aqui, outra bugiganga ali. Às vezes pode ser algo importante que se perde na confusão. Mas, eventualmente, acabo achando. Tenho preguiça de procurar por muitas coisas. Me cansa. Sou acomodada demais, acho. Ou, talvez, eu só não esteja afim de achar o que você quer que eu ache agora. Não agora. Deixa ali, guardado, no meio da minha caixa de meias. No meu quarto tem de tudo. Livros que não leio mais; recordações de lembranças que preferia esquecer - mas não sei jogar fora; lápis de cor só para enfeitar e decorar os desenhos que não sei mais colorir; papéis com escritos que nunca mais irei ler; roupas que não uso mais; um violão novo; uma tevê velha; um computador meia-boca; minha calça preferida, minha blusa surrada que insisto em usar; minha cama que já pedi em casamento; o telefone que só toca pra me acordar do sonho mais lindo; meus dois pares pretos de All Star. Coisa boa ou ruim, não importa, é tudo meu. Sou assim, egoísta, possessiva e cheia de não-me-toques. Nessas horas, viro uma criança de sete anos com aquele discurso de é-meu-e-eu-faço-o-que-quiser-dele e o famoso os-incomodados-que-se-retirem.
Não, não tente arrumar minha bagunça. Se você quiser fazer parte dela, seja bem-vindo. Mas lembre-se: eu te coloco onde eu quiser e, se algum dia você sair dali, te considero, oficialmente, fora do lugar.

quinta-feira, 1 de março de 2012

Hangover




Acordei num daqueles dias que coloco o alarme para despertar só para ter o gostinho de desligá-lo e voltar a dormir. É engraçado como que no segundo que segue após o abrir dos olhos, você não se lembra quem é, onde está e muito menos do que fez no dia anterior. Para tudo. O dia anterior. Meu Deus. O primeiro segundo passa e como uma profecia se concretizando, sua cabeça começa a doer, seu coração começa a saltar, sua memória volta naqueles flashes inconvenientes e desconexos que podem matar de tensão. Melhor levantar. Como? Minha cabeça parece uma âncora no travesseiro. Ensaio uma, duas, não mais que três e dou um pulo. Tudo rodopiando. É até divertido. Pelo menos estou em casa, penso. Vou cambaleando até o banheiro torcendo para ninguém ter o desprazer de ver a encarnação do diabo depois de uma festa no céu. Mas é óbvio que Murphy tá aí pra isso. Oi, mãe. Invento uma desculpa para ir direto pro banheiro e não ter que ir dar aquele beijinho de bom dia exalando álcool. Volto pra cama e prometo nunca mais beber. O telefone toca. E aí, qual é a boa? Beleza então, nos vemos mais tarde. E lá vou eu de novo.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Orçamento







Depois não venha me dizer que eu não tentei. 
Depois não venha me dizer que não te quis.
Depois não venha me dizer que não te desejei você
o tempo todo.
Aqui.
Comigo.
Mas você quis experimentar com outra pessoa.
Você quis estar de um jeito que eu não quis estar.
Você quis entender um assunto que não compartilho com você.
Como ousa?
Como ousa invejar o que tenho com outra pessoa
mas desejaria ter com você?
Como quer que eu entenda algo que você não
fez questão de saborear comigo?
Não sei.
Só entendo que você não é quem eu, inusitadamente, avaliei que fosse.
Porém, eu fiz o orçamento e, vou te contar, é caro. 
Mas quem não quer pagar?

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Eu prometo







Prometo não prometer que vou te amar para sempre
Prometo não prometer que nunca vou te decepcionar
Prometo não prometer que serei sua até meu último suspiro
Prometo não prometer que nunca vou errar
Prometo não fazer promessas vãs

Prometo ficar
até onde der pra ficar ou ficar até onde der

Prometo te carregar
até quando nossas almas forem leves

Prometo te fazer sorrir
até quando o riso for fácil

Prometo chorar
até quando houver motivo para cessar as lágrimas

Prometo tentar
até quando tentar não for uma promessa

Prometo prometer só o que posso prometer
até quando ficar, carregar, sorrir, chorar e tentar for só uma consequência
do meu eu com você.

Eu prometo

Convicted

Pra escutar enquanto lê:
|| ♫♪ Roads - Portishead ♫♪ ||






A textura da sua pele suga a minha loucura enquanto toda a intensidade do meu corpo vibra com sua libido. O seu gosto é inconfundível e minha língua procura sua boca como um cão farejador. O meu guia é sua vontade. Sua vontade é meu tesão. Seu tesão é meu prazer. Seu prazer é meu. Não te gosto além do óbvio. Odeio o óbvio. É anormal o tanto que meu desejo procura suas curvas, seu cheiro, seus encontros descompassados e desarrumados onde me encontro. Me encontro em você e você é minha perdição. Então me provoque. Seja minha tentação porque eu quero provar para você que a minha intenção não é boa. Ah, muito pelo contrário! Eu sou má. Eu quero devorar seus desejos mais secretos e me embriagar, ficar bêbada de você. E a ressaca? Foda-se. Se for para viver com essa ressaca de você, eu já me condeno à morte.

A língua dos meus olhos




O jeito que você olha pra mim deveria ser considerado imoral ou, pelo menos, eu deveria receber algum tipo de taxa cada vez que você me olha assim. Ele me desconserta, sabe? Algumas vezes eu consigo olhar de volta e ficamos ali durante aqueles segundos que parecem anos, envoltos em um mundo só nosso, revestido por essa enorme bolha que resolvemos explorar. Outras vezes eu desvio o meu olhar do seu porque não quero ler o que ele me diz, não quero admitir que ele tem todo esse poder sobre mim, não quero te dar o gosto de ver formar aquelas salgadas e irritantes lágrimas que cismam em brotar no mesmo cantinho e sair trilhando aquele caminho sulcado - e imaginário - que as outras teimosas já deixaram ao passar.
Não me olha desse jeito se não for pra fazer meu mundo mudar de cor ou fazer o barulho dos carros e do caos da cidade desintegrar em um silêncio ensurdecedor; ou minha pupila dilatar e meu coração bater daquele jeito que você gosta de ouvir quando repousa seus ouvidos no meu peito. Não me olha assim se não for pra me dizer - e sem gritar - que você me quer. Olha, eu quero que você me veja, que me enxergue. Afinal, acho que até hoje só você não entendeu a língua que meus olhos falam quando dizem que... é você.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012







Eu gosto de ser responsável por fazer você conseguir se colocar diante do seu orgulho, como se fosse um espelho, e refletir-se, refletir e refletir em mim. Não parece pecado pra mim.

Lágrimas malditas







Você diz que não temos pra onde ir mais, que o único jeito agora é voltar. Mentira! Pra onde iríamos? Não vamos. Ficamos. Eu fico. Você vai. Eu vou. Você fica. Vamos.

Lágrimas malditas! Salgadas, tocam meus lábios. Gosto de fel.
O risco que elas deixam ao trilhar meu rosto você não quis correr.
Você quer correr de mim. Trilhar seu risco longe de mim.
Minha insegurança te incomoda. É óbvio. Mas você não vê o tanto que mudei PARA você? Para me encaixar nos seus planos, nos seus horários, na sua vida. Desse meu jeito atrapalhado, sim, mas eu estava chegando lá. Você quer segurança mas não quer se segurar em mim. Justo agora você não quis pagar pra ver. Talvez você esteja certo então. 

Deficiente







O tanto que eu gostaria de falar é o mesmo tanto que eu gostaria de ouvir. Por que você não completa minha frase? Fica... aqui.
Você me intimida.
Você transforma meu não em sim
Fico surda, muda e cega perto de você.
E me afasto. Tenho medo, oras. 
Corro e acho que estou indo pra longe, mas você é o labirinto mais gostoso no qual já me perdi.
Eu sou livre, não gosto de lugares fechados. Sou claustrofóbica. Mas você me prende e eu nem me importo. Eu gosto de me sentir sua. E você é meu. Entendeu? Você vem primeiro.
Eu venho de você. Você vem de mim. É um parto que agoniza. Um bebê que não quer nascer. É confortável ali dentro. Mas uma hora, inevitavelmente, você fica exposto e tem que esticar os bracinhos ainda frágeis, abrir os olhos pr'aquela luz da qual antes não precisava, mas que agora lhe é essencial; chorar ao sentir o ar entrando, desavisado, como se não pertencesse aos seus pulmões. No começo tudo que parecia ser errado e machucava, agora é vital. Ou então é natimorto - desse não precisamos falar, apenas nos entregar às lágrimas por algo que existiu, sim, mas nem começou.
É a vida, como sempre, contraditória. É esse amor às avessas que antes, eu não precisava; durante, me machucava; e, agora, não consigo mais ser sem. Meu sou sem você, não é.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012







O pior é saber que o que você falou desse jeito, na sua sinceridade crua, é verdade.

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Inversamente igual







Lembro-me bem do dia que te olhei e não senti nada. Engraçado, né? É a mesma sensação, inversa, abduzida do momento no qual te vi pela primeira vez e sabia que, sim, eu sentia algo. Não sei se acontece com você, mas o difícil mesmo nem é admitir que já acabou. O difícil é entender que, talvez, não tenha nem começado. Não do jeito que era pra ser. Quando se hesita demais, também se perde demais. Onde há exagero, há falta. Onde há vontade, há intensidade. Tudo que é intenso, um dia acaba. Torna-se apenas tenso. Num lenço. Cheiro de incenso.



Enquanto o cigarro queima e se mistura com o cheiro árabe que corre pelo quarto, sinto que meus olhos me enganam. Meus ouvidos mentem pra mim. Meus sentidos me traem. A ilusão nunca é doce. No máximo, agridoce. 
Na gramática, o sujeito faz a ação e o objeto é passivo. Mas, vem cá, me explica uma coisa: se eu vou com você, você vai comigo. Não? Nem sempre. Com você é separado. Comigo é junto.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Diálogo entre mim e o órgão que pulsa




– Ei, vem cá, vamos conversar.
– Não.
– Eu quero te contar uma coisa.
– Não me interessa.
– Você é teimosa demais. Nunca me ouve.
– Tá bom. Eu não sou teimosa, mas vai, cospe.
– Não fala assim comigo. Eu sempre estou aqui apertado e você não parece fazer questão de me ajudar.
– Ah, você merece, viu. Nunca me obedeceu e agora que vir conversar. Qual é! O que você quer me contar?
Na verdade, não tenho nada para contar. Você só precisa saber que eu nunca te obedeci mas também nunca mandei em você. Se você fez o que eu te mostrei, foi escolha sua. Eu bato, você escolhe.
– Como ousa?
– Eu sou ousado.
– E idiota.
– Sou confuso, mas não sou idiota.
– Essa sua confusão me irrita tanto.
– A confusão pode começar aqui, mas você continua ela aí. Muitas vezes não tem nem confusão. Você que não admite.
– Você está me confundindo.
– Admita. Você gosta de uma confusão. Mergulha de cabeça e eu, bom, eu vou junto, né? Você sabe disso porque me sente pulsando em todas as suas partes. Rápido. Devagar. Forte. Devagar. Você me quebra e depois chora sobre meus pedaços, tentando me montar. Como se fosse fácil assim. Ainda estou te confundindo?
– Não. Você tem razão – Ah, que ironia! – Tem coisas que eu queria admitir. Mas outros sentimentos me impedem.
– Quais sentimentos?
– Ciúme, por exemplo.
– Ah, esse eu já tentei puxar papo, mas não adianta. Ele é um problema para mim também. Só que você é quem deveria manter tudo sob controle e não deixar ele chegar perto de mim. Quando ele chega, disparo. Faço você ficar quente e vermelha.
– É, você não ajuda mesmo. Só piora. Não sei como me livrar dele. Me ajuda?
– Era sobre isso que eu queria conversar com você.
– O quê?
– O produto das minhas pulsações e sensações, ah...o que é proveniente de mim, meu bem, nunca é ciúme. É outra coisa. Pare de se enganar. Você sabe muito bem o que quer.
– Sei?
– Sabe.
– O quê?
– Já disse que você sabe.
– Mas...
– Sem ‘mas’.
– Com ‘mas’. Sempre tem um ‘mas’.
– Não, sempre tem um ‘mais’.
– Mas...?

domingo, 22 de janeiro de 2012







Inclusive, acho que a gente conversa tão bem no silêncio.

sábado, 21 de janeiro de 2012

Escuta...





Meu compromisso com você não é banal. É moral, é emocional e corporal, porém fatal.

Duality







There's no place I'd rather be than here. I like the turbulence. So, won't you spin around me? You make me dizzy but I like watching you come and go. It's the unknown that kills me and makes me stay. So, won't you stop for a while and kiss me? Go. Spin. Turn around. Come back. Go. Come.

contra/diga/me





Já percebeu o quanto sou contraditória quando o assunto é você? Sou mesmo. Não, não sou! Você vira meu mundo de cabeça para baixo e eu sou a contraditória, a incoerente? Como ousa entrar e bagunçar minhas gavetas, revirar meu estômago, contorcer minha índole, subverter meus conceitos e depois questionar minha sanidade? Não sabe que é você que enlouquece meus sentidos e faz tremer meu chão. Ah, então vem! Venha e faça o que quiser de mim. Eu gosto de me perder em você, afinal, é lá que eu me acho. Nunca disse que eu era uma pessoa fácil, muito menos simples, mas você quer me ler. Você gosta de deixar seu paladar me provar, de sentir seu corpo arrepiando enquanto eu te devoro e rasgo minhas páginas. Você não sabe, mas a medida que te quero é 'a gosto'. A meu gosto. Eu gosto.